Passeio Ernesto Nazareth - Criação e significado
Imagem: Porto Maravilha RJ
O Passeio Ernesto Nazareth representa bem todas as fases do Projeto Porto Maravilha, por ser um dos poucos mobiliários urbanos da região que começou junto com o novo porto da cidade, logo após a derrubada da Perimetral e, como ele, ainda não se consolidou como obra acabada.
A construção de seu primeiro trecho – entre a Av. Pereira Reis e o Edifício Novocais – foi anunciada em 02.12.2016, ano da Olímpiada do Rio. Na ocasião seus limites geográficos, com exceção do Novocais, ainda não possuiam vida própria: o complexo do Porto Maravalley, que hoje também sedia o Instituto de Matemática Pura e Aplicada – Impa Tech, ainda não passava de um barracão de estrutura precária que sediou alguns eventos durante o ano olímpico, como uma exposição de arte de rua e talvez um ou outro evento isolado. O atual complexo Maravalley/Impatech, mesmo, só seria inaugurado em 02.04.2024.
No mais, só havia dois terrenos que ladeavam o parque: no do lado esquerdo (de frente para a Av. Pereira Reis), funcionou a Nau do Conhecimento “Rua City Lab”, que se manteve por curto período até ceder espaço para construção do Pateo Nazareth, residencial da Cury, e atualmente (jan25) em final de construção. Do lado diametralmente oposto, em frente ao atual Porto Maravalley, começou a ser erguido o Rio Energy, também pela Cury Construtora (já em fase de entrega).
O segundo trecho não foi a área contínua ao primeiro, que estava bloqueada do lado esquerdo por um antigo prédio em ruínas (de frente para a R.Cordeiro da Graça), e pelo lado direito pelo terreno onde se levantava o Rio Energy. Todo o trecho compreendido entre a Cordeiro da Graça e o Ed. Novocais permaneceu por oito anos como um terreno baldio cercado por muros, até sua abertura – no final de 2024 – após a demolição de um, e a conclusão das obras do outro. Dessa forma, esse grande terreno vazio ficou separando o primeiro trecho do segundo, que seria construído entre a Rua Cordeiro da Graça e a Rodoviária do Rio, e entregue somente em março de 2024. Esta área não era cortada antes por nenhuma rua, mas por casas antigas (e abandonadas, ao que se sabe) que precisaram ser demolidas para permitir a continuidade do Passeio Ernesto Nazareth.
O terceiro trecho, entre o Edifício Novocais e a Rua Cordeiro da Graça, só começaria a ser construído em julho de 2024, ainda entre muros pelos quatro lados, até ser finalmente entregue em dezembro desse ano para transformar o Passeio num corredor único e contínuo em toda a sua extensão.
Mas a razão para o Passeio Ernesto Nazareth ter se tornado emblemático enquanto símbolo da revitalização do porto, reside no fato de seus três trechos terem acontecido em paralelo com os três momentos mais significativos do Projeto Porto Maravilha: a fase dos grandes eventos sediados pelo Rio, a segunda quando o porto começou a ganhar formato de bairro pelos grandes residenciais sendo erguidos ali, e mais recentemente a que focou o “boom” de sua mobilidade urbana – protagonizada pelo Terminal Gentileza e o BRT Transbrasil – trazendo de volta uma movimentação de pessoas pela região que só existira antes da derrubada da Perimetral.
Claramente se percebe neste início de 2025 o ingresso do porto na sua “fase orgânica”, quando os moradores dos novos residenciais começam a chegar para transformar toda a região num organismo vivo e pulsante que estará superando até seu vizinho mais próximo, o centro financeiro da capital, por se ver convertido em local ermo após o horário comercial. Então podemos dizer que tanto o Porto Maravilha quanto o Passeio Ernesto Nazareth tiverem seus períodos de nascimento, crescimento e maturidade acontecendo em paralelo ao projeto de revitalização como um todo, onde ambos agora só aguardam pelos “colonizadores” para sua consolidação, já que superada a fase restrita aos “pioneiros”.
Importante lembrar, entretanto, que estamos falando de uma consolidação focada em infraestrutura e população (juntando o orgânico ao inorgânico em termos de existência autônoma), posto que o projeto de consolidação do Porto Maravilha – planejado para 30 anos – só estará oficialmente consolidada em 2039, data essa assumida como “deadline”, e se previu que toda a região já esteja vivenciando a normalidade de qualquer outro bairro carioca.
Cabe ainda ressaltar que é esperada uma normalidade um tanto distinta da que nos acostumamos: a de um estilo de vida colocado num outro patamar e ainda não experimentado na cidade (ou na maioria das cidades brasileiras), que é o de reunir diferentes classes sociais não apenas no mesmo espaço físico, mas num padrão equiparado de dignidade onde nenhum deles se perceba diferente do outro, como já acontece nos diversos espaços culturais surgidos na região, e que encontrou no MAR – Museu de Arte do Rio, a sua maior expressão devido à sua transformação inequívoca num lugar de convívio permanente entre diferentes, e “onde todas as tribos se encontram”, sendo impossível não percebe-lo desde o primeiro momento em que ali chegamos.
A experiência do Porto, de projeção internacional focada na democratização do espaço urbano, pode ser a primeira de um país marcado historicamente por diferenças sociais até então intransponíveis. Trata-se de um aceno a uma realidade em que integrantes de classes privilegiadas não mais precisarão “descer de patamar” para se mostrarem iguais. As menos favorecidas é que estarão contribuindo para um novo referencial de dignidade humana ao se misturarem em espaços antes segregados para vivenciar conhecimento, cultura e lazer em condições de igualdade, sem as restrições de acesso que vinham encontrando até este momento.
Trata-se apenas de uma esperança surgida de sinais ainda
tênues e esparsos, que já é possível perceber? Pode ser. Elas já aconteceram no
passado para sucumbir na administração seguinte. Mas já se pode afirmar que
passamos a fase da utopia pelas fortes raízes de longo prazo que foram fincadas,
e isso apenas já traz segurança de que um retrocesso, desta vez, vai ser bem
mais difícil de acontecer, e a tendência é de que o modelo se estenda a outras
áreas, tornando essas raízes cada vez mais profundas e resistentes para que as
arranquem. Resta-nos acreditar, mas não apenas:
é mistér seguir vigilantes!
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